Fonte: Folha de SP
Entre os impactos causados pela pandemia de Covid-19, a fome é um problema social que voltou com força à mesa dos brasileiros.
Segundo o Grupo de Pesquisa Alimento para Justiça, 125,6 milhões de brasileiros (59% da população) não comeram em quantidade e qualidade ideais desde a chegada do coronavírus.
Em situação ainda pior, são os estimados 19 milhões de pessoas no país que passaram fome em 2020, primeiro ano da crise sanitária, de acordo com estudo da Rede Penssan (Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional).
Para amenizar a insegurança alimentar que pesa contra as famílias mais vulneráveis, uma coalização formada por empresários do setor supermercadista do país lançou uma campanha de arrecadação de doações em dinheiro nesta terça-feira (20).
Todo o dinheiro angariado será convertido em cestas básicas ou cartões com crédito de R$ 100 para compras de alimentos em qualquer supermercado do país. O modelo é parecido com o Programa Bolsa Família, mas a diferença é que o crédito só será usado na aquisição de alimentos e será ofertado, inicialmente, uma única vez.
Sob o guarda-chuva da Abras (Associação Brasileira de Supermercados), a campanha terá a duração de 120 dias e pretende alcançar não apenas o empresariado do setor, mas doadores de outros segmentos, além de pessoas físicas.
João Galassi, presidente da Abras, disse na apresentação da campanha aos jornalistas que as doações serão divididas em dois grupos para facilitar a logística de distribuição a quem mais precisa.As doações de até R$ 5.000 serão entregues à Ação Cidadania, ONG fundada pelo sociólogo Betinho (1935-1997), que combate a insegurança alimentar no país há 28 anos. A entidade vai converter os valores doados em cestas básicas.
Com sua rede capilarizada de entregas de alimentos, a Ação Cidadania disse que emitirá um comprovante fiscal aos doadores após a entrega dos alimentos aos beneficiados.
“A fome não é uma criação da pandemia. Depois dela, o problema continuará entre nós. É preciso educação, oportunidade de emprego e saúde para combatê-la, mas enquanto isso não chega às populações vulneráveis, iniciativas como essa amenizam o problema”, disse Rodrigo Afonso, diretor da Ação Cidadania.
Afonso lembrou que o Brasil saiu do mapa da fome extrema em 2014, mas “foi preciso menos de quatro anos para voltarmos ao grupo de países nesta condição. O problema só piorou na pandemia”.
Já os valores acima de R$ 5.000 serão transformados em cartões com créditos de R$ 100 cada um. “Serão os próprios empresários que, no momento da doação, vão escolher a região em que os cartões serão entregues”, disse Galassi.
Na região escolhida, a entrega dos cartões será feita em parceria com os municípios a partir dos cadastros de pessoas em situação de vulnerabilidade social que já são beneficiadas por programas de assistência.
Ronaldo dos Santos, presidente da Associação Paulista de Supermercados, disse que serão as prefeituras as responsáveis por dizer quem poderá receber o crédito. “Porque elas já mantêm as informações das famílias mais vulnerabilizadas”.
As famílias beneficiadas com o vale-compra de alimentos poderão usar o crédito quantas vezes quiserem até o limite do valor ofertado. A partir do desbloqueio do cartão, o dinheiro estará disponível para uso em até 90 dias.
Os únicos itens não permitidos para compra serão cigarros e bebidas alcoólicas. Os primeiros cartões serão distribuídos em até 30 dias. Os empresários não poderão deduzir o valor doado em imposto de renda, mas terão suas logomarcas fixadas nos cartões.
A dedução de imposto também não será permitida para pessoas físicas. O primeiro aporte doado, de R$ 50 mil, foi feito por Valdemar Martins do Amaral, diretor do grupo ABC, com supermercados espalhados por Minas Gerais. “Quero que essa doação alcance as famílias da minha região. Se cada um cuidar do seu terreno, a fome acaba”, disse.